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Minha jornada na carreira de programação parte 1

De tempos em tempos, algumas pessoas aparecem no linkedin perguntando sobre como foi que eu fiz para chegar onde eu cheguei. Imagino que as pessoas perguntem isso no sentido de buscar algum mapa para seguir ou caminho para tomar. No geral, eu acho isso interessante porque não acho que a minha jornada seja algo que valha a pena ser estudada. Porém, resolvi aproveitar essa noite de 21 de outubro de 2023 (faltando um minuto para a virar 22) para escrever muitas linhas sobre isso. Vou tentar trazer a maior quantidade de informação relevante. Por causa disso, esse texto vai ser dividido em 2 partes: a primeira indo da minha infância até a tentativa de ir para Tallinn e a segunda começando com a minha deportação da Estônia e indo até os dias atuais. Antes de começar, já quero deixar bem claro minha jornada não é algo inspirador e não deve ser usada em nada para comparação comecei em outra época, tive meus privilégios e cometi meus erros.

Quatro fatos importantes marcaram minha infância: minha mãe tinha certeza que ia morrer cedo, eu era uma criança inteligente, fui uma criança estimulada para aprender mais e minha infância foi marcada por um ensinamento religios chamado Seicho-no-Ie. Como minha mãe tinha fortemente essa certeza, ela sempre buscou me preparar para não depender dela. Aprendi a cozinhar muito cedo e desde quando eu me lembro eu passava meus dias sozinho lendo ou bricando. Por falar em livros, durante a infância morei com meu pai e minha mãe, os dois sempre foram de ler muito. Dessa forma, eu também cresci com o hábito da leitura. Por ler bastante e por ter uma memória boa, acabei aprendendo muitas curiosiades. Os adultos ao meu redor achavam muito fofo uma criança que sabia tantas curiosidades e me incentivavam (com palavras de carinho e doces) para continuar. Isso foi criando um ciclo que era extremamente benéfico para mim. Por fim, desde cedo participei da Seicho-no-Ie. Não vou entrar no mérito da discussão religiosa aqui, porém o que vale dizer é que desde sempre fui criado com afirmações de que eu poderia fazer qualquer coisa e que eu tinha capacidade infinita.

Corta pra pré-adolescência, meus pais se separam efetivamente. Minha mãe faz das tripas corações e sigo estudando em colégio particular. Aqui aconteceu meu primeiro contato com a escrita criativa. Tentei escrever um ou dois livros nessa época, para o bem de todo mundo e para eu não sofrer nada de vergonha, esses livros nunca passaram das 5 páginas, ninguém nunca leu e os arquivos foram deletados há tempos. Começa a aparecer um traço forte que até hoje me acompanha (apesar dos esforços para sumir com ele): a arrogância. Eu era bom, eu era inteligente, eu sabia disso. Com uma rápida passada de olho já aprendia os conteúdos e me orgulhava de ser um dos melhores. Um episódio que exemplifica isso é que na época de fazer o ensino médio, eu decidi que ia fazer no CEFET-SC (atual IFSC). Para tanto, eu precisaria passar numa prova estilo mini vestibular. Caso não passasse, não teria onde estudar. Não via sentido em fazer uma matrícula em alguma outra escola porque era evidente que eu ia passar. Estava certo, graças ao auxílio do meu pai e de minha mãe, passei entre os 10 primeiros. Porém, o fato de eu considerar que passar na prova era meu lugar de direito, já mostrava como eu achava que o mundo estava lá para me servir.

Na adolescência, esse traço de arrogância ficou mais acentuado. Com exceção da matéria de física, eu não estudava. Me sentia até orgulhoso do meu comportamento displiscente. Afinal, eu era especial e conseguir passar nas disciplinas sem estudar só demonstrava como eu era especial. Não era do tipo que matava aula, porém não costumava prestar atenção direito, não fazia os deveres e fiz a maior parte dos trabalhos no dia da entrega. Aqui tive a primeira tentativa de fazer um blog, junto com mais dois ou três amigos tentamos montar algo no blogspot porém acabou não dando certo. Também com a minha primeira tentativa de fazer um programa de computador - um joguinho tipo snake só que era um quadrado que “comia” outros quadrados. Queria ir para a área de jogos, o SENAI tinha uma turma para abrir. Fiz a inscrição. Porém não fechou aluno o suficiente. rapaz que informou isso para nós, disse que ia abrir um curso técnico de programação em Java que era praticamente a mesma coisa. Para minha sorte, ele estava errado, ainda assim comecei a fazer um curso técnico de programação, porém o meu comportamento nesse curso também era péssimo. Foi nessa época que meu enorme ego teve golpe tremendo: fiz o vestibular de meio de ano e não passei. Meu mundo caiu naquele dia. Como poderia alguém tão incrível como eu. Tão inteligente e safo como eu era não ter passado no vestibular?! Mais uma vez, minha amada mãe fez vários corres e conseguiu uma bolsa para me colocar num cursinho pré-vestibular. Movido pelo ego ferido, comecei a estudar. Foi um período interessante, estressante onde sentia que estava extraindo mesmo minha capacidade. Ia para as aulas nos 3 períodos e usava o tempo extra para estudar as coisas do pré-vestibular. Apesar da motivação não ser nobre, o resultado deu certo, fui aprovado entre os 10 melhores do curso de ciência da computação na UFSC.

Nesse período de UFSC (de 2009 até 2015), senti que as coisas haviam voltado ao seu respectivo lugar. Logo relaxei e voltei ao meu comportamento displiscente. Mais do que isso, meu comportamento piorou, pois ia para muitas aulas para ficar jogando e matei muita aula. Nos dois semestre eu tive o segundo e terceiro golpes no meu ego: reprovei em metade das disciplinas (algumas delas por falta), e conheci pessoas que eram muito mais inteligentes e esforçadas que eu (como o professor Daniel S, o veterano LFS Xavier ou as colegas Thais BI e Jéssica PdCB), porém de uma humildade tremenda, sempre respeitando os próximos desafios e estudando para conseguir passar por eles. Na época, aquilo não fazia sentido eles eram inteligentes e já sabiam o suficiente para passar, por que eles faziam mais? Levei anos para entender isso. De novo movido pelo ego ferido, tomei a solene decisão de que me dedicaria muito e seria melhor do que eles. A dedicação durou um semestre - e minhas notas não foram as melhores existentes. Nessa época, resto da minha vida acadêmica foi conturbado. Alternava entre semestres ruins e regulares, sentido raiva por ver meus colegas evoluindo e eu ficando para trás. Eu não sabia como estudar, quais eram meus pontos fortes para o estudo e isso me colocava em grande desvantagem. Em termos de contato com a escrita, foi nessa época que escrevi meu primeiro blog blog de poesias e contos. Ele ainda existe lá. De vez em quando volto para relembrar de como eu era dramático.

Em dezembro de 2012, fui morar sozinho. Era a época de ouro do “minha casa, minha vida” e minha mãe havia compradom um apartamento comigo. Ela pagaria todas as contas até eu me mudar e depois ele seria de responsabilidade minha. Me lembro de passar a virada do ano na sacada do apartamento, com uma garrafa de vodka e uma de sprite olhando para os fogos e pensar “2013 vai ser o ano do aleatório”. Estava certo, mas pelos motivos errados, então eu acho que estava errado. Nesse ponto da narrativa, já deve estar claro que eu não estava preparado para as liberdades da vida universitária. Eu estava menos pronto ainda para a vida acadêmica. Meu semestre de 2013-1 foi o pior de todos. Quase não ia para a aula, quando ia não prestava atenção entre outros rolos. Ficava tempos sem falar com ninguém. Fiz dois estágios cuja atividade principal era ficar scrolando o facebook. Passava o dia vagando na internet sem nenhum propósito. Tinha chego na etapa de TCC, mas nem isso funcionava direito. Dois episódios me marcaram muito: o dia que eu dormi por 24 horas seguidas e o dia que eu ensaiei colocar a cabeça dentro do fogão e ligá-lo - até hoje não tenho certeza se eu liguei ou não, mas o desejo de acabar com aquilo era muito forte. Eu era ativo nas atividades religiosas e, mesmo nelas, eu estava bem relapso. Me lembro de ter participado de uma determinada atividade com então Vice-Presidente da Associação dos Jovens Ariovaldo Adriano Ribeiro. Havia algo na fala dele que me chamou a atenção e fui pedir uma orientação pessoal. Na minha cabeça, a situação seria muito simples, eu iria conversar com ele por uns 10 minutos, ele me daria alguma reza para fazer e tudo ficaria bem. A conversa durou uma hora e meia, ele virou para mim e disse “olha, tudo isso que você está me relatando parece muito um princípio de depressão aconselho que você procure orientação médica também”. Aquilo foi ao mesmo tempo um soco e uma libertação. Foi um soco porque na minha cabeça depressão era coisa de maluco, mas foi uma libertação porque eu senti que alguém me entendia.

Voltei para casa determinado a fazer tudo diferente. E dessa vez eu fiz (ou mais ou menos). Chamei meu pai e minha mãe para conversar e tentei explicar a situação para eles. Eles concordaram em dividir os custos para um psicólogo para mim. Também decidi arejar um pouco a cabeça da UFSC, pegando apenas o mínimo de disciplina necessário (e desistindo daquele tema de TCC), para poder trabalhar. Mandei vários currículos, fiz algumas entrevistas e aceitei a primeira oferta de emprego que apareceu. Ganhando um total de R$1.400,00 em Julho de 2013 fui contratado como desenvolvedor de software Jr Nível 4. Tudo parecia que ia bem, certo? Errado. Minha mente ainda estava no ritmo de irresponsabilidade e tomei uma advertência formal da empresa por chegar atrasado e ter adulterado a folha ponto mais de uma vez. Ainda me lembro das palavras do Vandriani “João, você é um garoto bom que tem potencial, porém hoje você está em pecado com a empresa e você precisa corrigir isso”. Ainda tenho essa divertência comigo para lembrar de toda a situação. Pode-se dizer que foi desse momento que as coisas começaram a mudar de verdade. Desse momento em diante passei a buscar formas de gerenciar melhor meu tempo, ser mais produtivo e formas de estudar melhor.

No ano de 2014. Voltei a morar com minha mãe, arrisquei meus experimentos com diferentes tipos de blogs e tentei fazer meu segundo tema de TCC, usando um segundo orientador. Nessa brincadeira de blogueiro, aprendi sobre SEO, métricas de performance, Google Analytics, Google Console e um monte de ferramentas importantes para usar para fazer um blog crescer.

Muitas coisas aconteceram no ano de 2015. Em segredo decidi largar a UFSC. Minha equipe que era de 3 pessoas foi reduzida para uma “euquipe”. Meu chefe decidiu que finalmente iria reescrever a aplicação toda para Java e eu puxei pra mim a responsabilidade. Junto com mais dois amigos, minha mãe e uma amiga dela, resolvemos montar o nosso negócio de TI. Pedi demissão e fui recontrado como PJ ganhando R$18,00/h (era uma época que eu não entendia muito sobre leis e direito trabalhista) para trabalhar 4 horas/dia. Tinha 24 anos já era arquiteto de software e CTO. Estava totalmente despreparado para ambos os cargos mas me sentia a última bolacha do pacote.

Em 2016, estava claro que a empresa que eu tinha feito não ia dar certo. Desfiz a sociedade, fiquei trabalhando como PJ em tempo integral (havia notado a merda que eu tinha feito no valor das horas e passei a cobrar R$28,00/hora) e tomei por decisão morar na Estônia - por causa desse plano tirei uma certificação Java. Também foi nesse ano que minha mãe se casou com meu padrasto e voltei a morar sozinho. Como iria morar na Estônia, imaginava que precisava passar por algumas experiências sozinho, por isso fui morar numa pensão. A ideia foi uma merda e em seis meses fui morar com um tio meu (claramente teve influência da minha mãe por trás do convite dele). Ainda pensando na Estônia, voltei a estudar. Não queria nada de UFSC ou TCC, por isso fui fazer um tecnólogo na Estácio. O curso era EAD, fácil, curto e daria o diploma que eu queria - eu já tinha o conteúdo por parte da UFSC. Me lembro do sentimento de vergonha que eu passei quando fui para a UFSC pegar documentos para validar as disciplinas. Eu me sentia um fracasso e uma vergonha por ter desistido da graduação já no final.

No ano de 2017, meu salário aumentou para R$32,00 e começou a implantação do software que eu estava liderando o desenvolvimento. Isso por si só já vale uma série de postagens sobre os erros que eu cometi. O final daquele ano foi terrivelmente complicado mas de alguma forma, consegui sobriviver e fazer o software ficar quase estável. Também foi nesse ano que eu escrevi o livro que chegou mais perto de chegar ao fim. Foram quase 50 páginas contando aventuras imaginadas de um personagem que eu criei para um RPG.

No ano de 2018, o software ficou estável, minha namorada da época terminou comigo, troquei de moto (lembrem que eu ia para a Estônia, logo fiquei com essa moto por uns 4 meses), ajudei a organizar o maior evento da história da associação dos jovens da Seicho-no-Ie em Florianópolis, me formei, pedi demissão e fui pra Estônia. Nesse ponto as coisas deram bem errado. Porém isso é assunto para uma próxima postagem. Espero que você esteja gostando de acompanhar minha jornada com os erros e acertos. Para ir para a parte dois, basta clicar aqui. E

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